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Eu indico |
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Bibliotheque Pascal (Alemanha/Hungria/
Reino Unido/Romênia, 2010) |
Mona é
vendida como escrava pelo próprio pai a um estranho bordel, onde as
prostitutas são forçadas a agir como personagens literários.
Roteiro e direção de Szabolcs Hadju.
Era
uma vez... um spoiler!
Um
trailer empolgante como o deste filme, com uma trilha sonora bacana,
deveria ser visto por todos. Com certeza muitos correriam para
assistir. Quem ainda não viu, recomendo deixar para ler esta
postagem depois (por isso o spoiler no título).
A cigana
Mona (Orsolya Török-Illyés) vive nas ruas da Hungria ganhando a
vida como artista. Para recuperar a guarda da filha, que deixou aos
cuidados de sua tia, ela precisa explicar sua história ao assistente
social, mas o que ela narra é uma aventura com momentos surreais. Em
meio a histórias fantásticas, conhecemos a personagem e sua filha,
assim como os suas improváveis aventuras e outros personagens
pitorescos. A criatividade do húngaro Szabolcs Hadju se mostra fator
crítico de sucesso. Imagine uma pessoa com o poder de projetar o
próprio sonho para os outros verem. E, em seu clímax, o filme
culmina para um bordel cult, o Bibliotheque Pascal, quando a
personagem é vendida como escrava e fica aprisionada neste, onde os
clientes podem viver suas fantasias sexuais com personagens
pertencentes aos clássicos da literatura. Através de magníficas
tomadas, efeitos especiais e uma trilha sonora muito boa, o diretor
húngaro esbanja estilo e ousadia. Sob uma superfície de belas e
sedutoras imagens, há uma história demasiadamente humana de uma
mulher que usa a fantasia para amenizar as dores de sua existência,
talvez até para esquecer de decisões que ela mesma tomou, ou coisas
que não conseguiu evitar.
É
importante perceber que Mona é uma exímia contadora de histórias,
em algumas passagens do filme isso fica claro (ela ganha a vida
exibindo um teatro de fantoches bem criativo e, no final do filme,
conta uma história para a filha dormir, bem semelhante ao que
aconteceu no Bibliotheque Pascal). Desde a forma como ela conhece o
rapaz que foi o genitor de sua filha, até a parte onde ela é
resgatada do Bibliotheque Pascal, de forma extremamente surreal, já temos pistas de que aqueles acontecimentos foram inventados, pois
estamos em um drama, e não numa ficção. Porém, o que seria real
naquilo tudo, já que Mona camufla os acontecimentos com uma história
criativa? Ela constrói um mundo de sonhos e ilusões para tentar
amenizar a dor que sofreu por toda a vida. É fácil comparar com o
enredo dos filmes “Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas”
(2003) e “As Aventuras de Pi” (2012), dado seu contexto cheio de
situações fantásticas. Assim como Pi, ao ser forçada a contar a
história verdadeira, a personagem chora.
Era uma
vez, um poderoso rei, que tinha um palácio enorme,
que era guardado
por anjos mortos e ficava nas profundezas do solo,
não
muito longe do inferno.
Ele
tinha centenas de quartos. E havia uma centena de prisioneiros nos
cem quartos.
Eram todos personagens de contos de fadas, príncipes e
princesas.
E os
príncipes e princesas estavam muito tristes porque foram retirados de
seus contos de fadas.
Mas as
crianças estavam ainda mais tristes porque quando abriam os livros,
achavam um monte de palavras chatas.
Não
havia ninguém que pudessem admirar ou se entusiasmar,
ninguém que
pudessem imaginar ser antes de adormecerem à noite.
Mas
havia uma pobre princesa entre eles.
E ela decidiu fugir do palácio
e retornar para seu conto de fadas...
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