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Eu indico |
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Kaze Tachinu (Japão, 2014) |
Jiro
Horikoshi vive em uma cidade no interior do Japão. Um dia, ele tem o
sonho de estar voando em um avião com formato de pássaro. A partir
desse sonho, ele decide que construir um avião e colocá-lo no ar é
a meta da sua vida. Durante a busca pelo seu sonho ele conhece Naoko,
uma jovem encantadora por quem se apaixona. No entanto, Naoko fica
profundamente doente, sem saber se sobreviverá. Dirigido por Hayao
Miyazaki.
Le
Vent se Lève - COM ALGUNS SPOILERS "AO VENTO":
Nesta
animação madura e romântica, o diretor segue uma narrativa
diferente em relação aos seus filmes anteriores, não lidando com o
quesito fantasia; pelo contrário, trata-se de uma cinebiografia -
muito bem contada - em forma de animação, mostrando a vida de Jirô
Horikoshi, um visionário designer de aviões no Japão, que criou o
chamado “Zero” (Mitsubishi A6M Zero), um modelo que a marinha
acabou usando como máquina de guerra. Bastante delicado e, ao mesmo
tempo, chocante, o filme mostra um lado que muitas vezes não
enxergamos, de pessoas que influenciaram na guerra, mas tinham
intenções completamente diferentes. O Japão já estava em guerra
com a China e acabou ao lado dos Alemães na Segunda Guerra, sendo
assim um país muito julgado, assim como a figura de Jirô Horikoshi,
que foi de fato o criador do modelo que foi usado pelos Kamikazes
para destruir a base naval americana Pearl Harbor. O filme tenta
humanizar personagens reais. Desde garoto, Jirô admira o lendário
designer italiano Caproni, criador do modelo que se tornou conhecido
como Ghibli (palavra líbia que designa o vento do deserto, e que
virou o nome da empresa produtora de Miyazaki), tentando então
realizar seu sonho de criar algo belo e útil, mesmo se atormentando
com a tendência da marinha em utilizar seus aviões como armas de
guerra. Isso fica claro quando ele explica que o peso das armas vai
influenciar negativamente no projeto, e mostra sua vontade - junto
com Caproni – de criar um meio de transporte útil, para o máximo
de pessoas possíveis.
Ao mesmo
tempo, ele conhece o amor de sua vida, garantindo muitas cenas
singelas e românticas. A forma como Jirô e Naoko se conhecem e se
reencontram, anos mais tarde, é simplesmente poética e apaixonante.
Mas junto com isso vem a doença da garota, que sofre de tuberculose
e tenta a cura num hospital na montanha. Os aviões matam assim como
a doença, o corpo da amada sofre junto com a alma do designer, que
precisa conviver com a expectativa de perda de sua amada, junto com
as atrocidades da guerra. O romance “The Wind Has Risen” (1937),
de Hori Tatsuo, que se passa em um sanatório para tuberculosos em
Nagano, no Japão, serviu de base para contar o relacionamento de
Jirô e Naoko. São muitas inspirações para o filme, inclusive o
próprio Miyazaki, quando garoto, viu a mãe morrer de tuberculose.
Ele tinha parentesco com pequenos industriais ligados à aeronáutica
e os aviões foram sua primeira paixão.
É um
desenho para adultos por se tratar de um tema sério, mas também
para crianças que precisam amadurecer, inclusive trazendo
conhecimentos da história do Japão e da história mundial no
contexto da segunda grande guerra. O grande terremoto que devastou
Tóquio em 1923, por exemplo, pode ser contemplado no filme. Outros
detalhes, como a inspiração que o designer usou para criar o
formato do avião (uma espinha de peixe), assim como as metáforas
que usam o vento o tempo todo, permeiam a trama. O título em
francês, “Le Vent se Lève”, vem de um poema de Paul Valéry e a
citação completa é feita em francês mesmo, pelo protagonista e
sua amada: “Le vent se lève, il faut tenter de vivre” (O vento
se ergue, é preciso tentar viver). Esta é a grande lição do
filme, já que junto com a criatividade e inteligência humanas, vem
a lamentação com a nossa capacidade de usar a ciência para
destruição, de maneira que devemos estar cientes, mas também saber
seguir em frente com nossas vidas.
Também
precisamos destacar a parte técnica e artística, já que as cores,
profundidade, desenho das cidades, aviões, trens e todo o cenário
são impecáveis. Junto com efeitos sonoros e uma trilha musical
predominante, tudo se complementa com facilidade. A trilha é de Joe
Hisaishi, que trabalhou com o diretor em “Princesa Mononoke” e “A
Viagem de Chihiro”.
É
essencial conferir este filme de animação do diretor e desenhista
japonês Hayao Miyazaki, que anunciou sua aposentadoria para o cinema
recentemente (esta pode ser a sua última contribuição para a
sétima arte). É comum este diretor receber prêmios no Japão de
melhor filme de animação: “A Viagem de Chihiro” (2001) levou a
estatueta do Oscar e, em 2004, “O Castelo Animado”, minha
animação preferida, foi indicado. Normalmente lidando com o desenho
na sua forma tradicional, sem uso de muitos efeitos especiais, suas
animações possuem tanto a parte da arte impecável, quando uma bela
e profunda dramatização, sempre com uma crítica ou mensagem,
deixando este diretor como um dos mais famosos no gênero. Mesmo
humanizando um personagem que criou aviões que foram usados para
devastar, não impediu que o filme “Vidas ao Vento” recebesse uma
indicação como melhor animação neste Oscar mais recente. Talvez a
mensagem tenha sido compreendida, a mensagem de paz (também tratada
na animação “O Castelo Animado”), seja a paz mundial, seja a
paz de espírito. O vento se ergue, é preciso tentar viver.
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Fontes: