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Eu indico |
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Aurora (EUA, 1927) |
Seduzido por uma moça da cidade,
um fazendeiro tenta afogar sua mulher, mas desiste no último momento. Esta foge
para a cidade, mas ele, arrependido, a segue para provar o seu amor. Dirigido
por F. W. Murnau.
Despertar:
Em 1929 foi realizada a primeira
cerimônia do Oscar. Existiam duas premiações para melhor filme, e Aurora levou
como “Melhor Filme - Prod. Única e Artística”. Já disseram que este é o filme
mais belo do mundo. F. W. Murnau, diretor conhecido no mundo do cinema
expressionista alemão, dirigiu este que foi o seu primeiro filme em Hollywood. Pode-se
dizer que é uma história de amor melodramática, um drama romântico, sendo
considerado também o primeiro grande filme do Oscar, pois é o mais lembrado entre
os filmes que participaram da primeira cerimônia.
A vida de um casal interiorano sofre
uma drástica mudança quando tentada pelos prazeres da cidade. Diante de uma mulher
urbana, o homem não resiste e ela torna-se a sua amante, e ela com seu egoísmo
e interessada mais em dinheiro o convence a trair e matar a esposa. “Não
poderia afogar-se?” é uma frase dita pela amante, que choca na tela, com
direito a um efeito visual nas palavras que afundam no nada; um uso criativo deste
efeito no diálogo escrito, já que o filme é mudo (todas as falas usem o velho
letreiro na tela). A jovem esposa nada pode fazer além de implorar pela vida.
E, surpreendentemente, o homem desiste do ato na última hora.
Este filme é de uma sensibilidade
única. Como resgatar um amor depois de ter pensado e quase tentado assassinar a
pessoa amada? O que parece acabado, destruído e impossível de reversão, é
questionado e comprovado - o contrário - por Murnau. É um filme que
inicialmente tende ao trágico, até mesmo ao sinistro, e logo depois se
transforma magicamente em sensível, romântico e emocionante. A partir daí o
casal vive uma noite como se fosse o seu primeiro e maravilhoso momento, tendo
o espectador direito a algumas cenas de comédia e aventura, divertidas e que
dão uma boa sensação de alívio em relação ao início da trama.
Sendo preto e branco, os contrastes
de claro e escuro dão uma característica visual marcante ao filme, sendo isso uma
herança do cinema alemão da década de 20. No campo, prevalece o uso do escuro,
mas na cidade vem o claro, simbolizando essa contradição da consciência de um
homem diante das tentações da cidade, que o influencia a romper com a moral e os
valores religiosos. Nesse sentido, há um tom melancólico de despedida de uma
época. A revolução industrial e o estabelecimento do capitalismo são postos no
filme como agentes transformadores, elementos que agem no sentido de romper valores
como honestidade, integridade e fidelidade.
Apesar do diálogo mudo, Aurora já
contava com efeitos sonoros e Murnau fez bom proveito disso. O barulho dos
sinos na Igreja é como um despertar do homem, que marca o seu profundo
arrependimento; e da mulher que por amor ainda lhe dá mais uma chance. Sutil e
simbólico, com uma música acompanhando o desenvolvimento da história, podemos
nos apaixonar pelos personagens, que não possuem nome, justamente para
universalizar todas as pessoas que podem estar na mesma situação. “Aurora”
consegue um poder de concentração raro, até para quem não está costumado com
filmes mudos (e em preto e branco). Existem reviravoltas surpreendentes no
filme, e até um objeto que seria usado para uma finalidade acaba voltando em
outra cena e se encaixando no novo contexto de forma inteligente, como um presente para os espectadores “despertos”.
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